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    O brinde português que fundou os Estados Unidos da América

    Poucas vezes a História foi tão generosa para com os portugueses como naquele dia 4 de julho de 1776. Na Filadélfia, reunidos no Congresso Continental, os representantes das treze colónias ousaram desafiar o maior império do seu tempo. Ao assinarem a Declaração de Independência, não apenas fundavam uma nação que viria a transformar o mundo, mas também erguiam um brinde inaugural. O detalhe, tantas vezes esquecido, é que esse brinde não foi feito com champanhe francês nem com cerveja inglesa. O vinho escolhido nasceu na Madeira.

    A ligação entre o arquipélago português e a América colonial não surgiu por acaso. O vinho madeirense, fortificado e capaz de resistir a longas viagens marítimas sem perder qualidade, tornou-se uma bebida de eleição em Boston, Nova Iorque e Charleston. George Washington, John Adams, Thomas Jefferson e Benjamin Franklin tinham o hábito de beber e oferecer vinho da Madeira nas suas casas. Mais do que simples consumo, o ato de servir este vinho representava refinamento social e também autonomia, já que ao contrário do vinho europeu sujeito a pesados impostos britânicos, o da Madeira circulava com maior liberdade, escapando à política aduaneira de Londres.

    O gosto pelo vinho português revelava igualmente uma posição política. Num certo sentido, o vinho da Madeira funcionou como fermento silencioso da independência americana, porque alimentou a contestação contra as restrições impostas pelo Parlamento britânico. O famoso episódio do Madeira Wine Riots, em Charleston, em 1768, mostrava bem como uma mercadoria portuguesa se entrelaçava na vida quotidiana das colónias.

    Menos conhecido é o facto de Thomas Jefferson ter mandado construir na sua adega de Monticello uma divisão própria para armazenar vinho da Madeira, com um sistema de ventilação pensado para manter a temperatura adequada. O terceiro presidente dos Estados Unidos considerava-o insubstituível e chegou a recomendá-lo em cartas a diplomatas americanos na Europa.

    Outro detalhe curioso prende-se com o juramento de George Washington como primeiro presidente em 1789, celebrado em Nova Iorque. Após a cerimónia solene, as taças voltaram a erguer-se com vinho da Madeira, confirmando que a jovem república não esquecia a bebida que já marcara o ato fundador de 1776.

    O instante em que se celebrava a independência da América, com taças erguidas cheias de vinho que nascia em encostas íngremes da Madeira, transportava consigo mais do que uma celebração política. Aquele gesto refletia a marca de uma ligação atlântica, discreta e profunda, que unia um pequeno país europeu à génese da maior república moderna.

    O significado desse gesto permanece. Portugal, tantas vezes lembrado apenas pelas caravelas e pelos tratados, deixou também a sua marca em momentos inesperados. Uma garrafa de vinho servida no momento certo bastou para entrar no coração da História.

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    Paulo Freitas do Amaral
    Paulo Freitas do Amaral
    Docente universitário e do ensino básico e secundário, historiador e político português e é descendente da família real portuguesa, de Pedro Rodrigues do Amaral, conde palatino e colaborador do Papa (séc. XV).

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